Quando A Estrela Brilha... (Guião)
Guilherme dos Santos Gomes, 24.12.24
O filme começa com imagens de um apresentador de televisão dos anos 80 (estilo Telejornal da RTP) a encerrar a programação e a desejar um bom Natal aos espectadores.
Guilherme – Senhores telespectadores, obrigado por terem acompanhado a nossa emissão. É sempre uma honra ter-vos desse lado! Retomaremos a transmissão amanhã, às 7 horas, com o Telejornal. De mim, é tudo! Resta-me apenas desejar-vos a continuação de uma boa noite e um feliz Natal, na companhia de quem mais amam…
(A televisão é desligada abruptamente. Alguns segundos de tela preta. Surge o título do filme no ecrã.)
-- Créditos iniciais --
(Guilherme vai a descer a avenida, por entre as decorações de Natal, todo agasalhado e a falar ao telemóvel.)
Guilherme - Digo-te de coração: eu não consigo perceber esta coisa toda com o Natal! Só não acho minimamente interessante, mesmo!
Transeunte (grita-lhe) - GRINCH!
Guilherme (para o transeunte) - Santinho! (volta a falar para o telemóvel) E depois há isto! Parece que as pessoas não conseguem respeitar que há gente que simplesmente não gosta do Natal!
Marisa (do outro lado da chamada) - Tens que te tentar adaptar! Não é assim tão difícil!
Guilherme - E tu achas que eu não tento? Passo a vida nisso! Lembras-te daquela vez em que participei nas audições para aquele anúncio de Natal?
(Cut-gag com o Guilherme num palco a cantar uma música de Natal em frente a um júri.)
Jurado - Não querendo ser indelicado, mas tu não és exactamente aquilo que procuramos. Sabes que a nossa petrolífera tem uma certa reputação a manter, e a ti... a ti falta-te a emoção! Nós queremos passar às pessoas a ideia do ambiente familiar, do espírito de Natal. Não conseguimos encontrar isso em ti. Mas obrigado pelo teu tempo!
Guilherme (ainda ofegante) - Se fossem mas é para o cara...
(Retoma-se a cena de Guilherme a andar na rua.)
Guilherme - Eu fui completamente humilhado!
Marisa - Então fazes assim: quando chegares a casa, vais à Internet e pesquisas "Como preparar o Natal". Já que mais nada funciona, ao menos ficas entretido a ver as sugestões estúpidas dos experts que escrevem esses artigos!
Guilherme - Olha que isso até nem sequer é má ideia!
Marisa - Sabes que eu estou a brincar?
Guilherme - Olha, um beijinho! Tenho de ir!
Marisa - Tchau...
(Guilherme desata a correr. Corta para uma cena dele, já em casa, a pesquisar "Como preparar o Natal" no Google. Abre o site do WikiHow.)
Guilherme - Deixa cá ver isto... decorar a casa, dizes tu? Um pinheiro... Onde raio é que eu vou arranjar um pinheiro assim tão em cima da hora?
(Ema está em casa a arrumar umas coisas e, pelo meio de tralhas, encontra um velho álbum de fotografias.)
Ema - Já não via este álbum aos anos!
(Começa a folhear as páginas.)
Ema - Ai, éramos tão pirosas! Que cabelo é este? Que vergonha!
(De repente, fica com um ar mais cabisbaixo.)
Ema - E aqui estou eu e a Bia... Ela tinha umas bochechinhas tão fofas. Esta foto foi num Natal... um dos poucos que passamos juntas. Eu gostava tanto que ainda nos falássemos, mas a vida é mesmo assim. (fica em silêncio durante um bocadinho) Bom, tenho que arrumar isto!
(Ema está a aspirar a casa quando repara no telemóvel pousado na mesa.)
Ema - Ah, porra! Não custa tentar!
(Pega no telemóvel e marca um número. Põe-no no ouvido.)
Carolina - Quem é que será a esta hora? (impressionada) Leonor? (atende o telemóvel) Estou?
Ema - Bia? És tu? Só estou a ligar porque pronto... como é Natal, eu queria saber como é que estás. Já passou tanto tempo, desde a última vez! Quê? Uns 10 anos, não?
Carolina - Para aí, sim. Olha, eu sei que as tuas intenções são muito boas, mas se calhar o nosso afastamento foi pelo melhor! A morte do pai não foi fácil para nenhuma de nós, eu sei que não, mas talvez termos seguido caminhos diferentes... talvez tenha sido a coisa correcta a fazer.
Ema - Sim, se calhar... Se é assim que te sentes, eu vou respeitar. Só senti que talvez já tivesse sido tempo a mais, só isso!
Carolina - Leonor, isto é o melhor que temos a fazer, tu sabes que sim! Ambas agimos mal, ambas dissemos coisas que não devíamos ter dito... as coisas não acontecem por acaso! Tu tens a tua vida, eu tenho a minha, e acho que o melhor é continuarmos assim.
Ema (triste) - Claro que sim, sem dúvida! Então... Um bom Natal!
Carolina - Adeus, Leonor!
(A chamada é desligada. Ema está visivelmente triste.)
Ema - Parece que foi desta! Até um dia destes, Bia!
(Corta para a casa da Carolina.)
Carolina - Leonor, Leonor! Tu nunca mudas!
(Carolina recebe uma mensagem no telemóvel. É a fotografia delas quando eram mais pequenas, que a Ema tinha visto há pouco.)
Carolina (entre o triste e o arrependida) - Acho que fui um bocadinho bruta com ela... Se calhar ela até tem razão: é Natal, devemo-nos dar uma chance... Eu vou fazer isto resultar!
(Cena da Alice sentada numa mesa a acabar de escrever uma carta ao Pai Natal.)
Alice - E... fim! Espero mesmo que o Pai Natal me consiga dar o que eu quero, este ano!
(Alice levanta-se, pega no casaco e prepara-se para sair de casa.)
Luis - Onde é que vais com essa rapidez toda?
Alice - Vou só lá fora mandar a carta para o Pai Natal!
Luis - Está bem, mas não te demores, que o almoço está quase pronto!
Alice - OK!
(Alice sai de casa a correr e, pelo caminho dá de caras com o Rui.)
Alice - Bom dia, Sr. Mateus!
Rui - Bom dia, menina! Para que é esta correria toda?
Alice - Estou a correr porque tenho que enviar a minha carta para o Pai Natal! E este ano já me atrasei um bocadinho... Espero que ele ainda a consiga receber antes da Véspera de Natal!
Rui (entre risadinhas) - Pff... Pai Natal! A sério que ainda acreditas nisso?
Alice - E porque é que não haveria de acreditar? Você não acredita?
Rui - Claro que não! O Pai Natal não existe, nunca te disseram isso?!
Alice - Não... existe?
Rui - É claro que não! Um gordo, de barbas, que entrega prendas a todas as crianças do Mundo numa noite, e viaja num trenó voador puxado por renas? Onde é que isso faz sentido?
(A Alice fica chocada e deixa cair a carta ao chão. Com lágrimas nos olhos, volta para casa a chorar. A câmara foca na carta:
"Querido Pai Natal, o único desejo que tenho este ano é saber que tu és mesmo real! Ah, e também queria a paz no Mundo, mas isso já era mais um capricho meu... Adoro-te! Ass.: Maria")
Guilherme (num aparte, levantando a câmara do chão) - Eu sei que não tem lógica absolutamente nenhuma a carta não estar metida num envelope nem tampouco dobrada, mas esta cena não ia funcionar de outra forma, OK? Não sejam mesquinhos, é Natal!
(Cena em que o Pai Natal está a olhar-se ao espelho na casa-de-banho e começa a dançar e a cantarolar que é o maior, e assim. De repente, entra um elfo que o interrompe.)
Ema (a olhar para o telemóvel) – Pai Natal, recebi um email do Departamento de Peluches e eles estão a dizer que já acabou o enchimento. O que é que eu respondo?… (olha para cima).
Guilherme (meio embasbacado) – Acabou o enchimento, foi?
Ema (atrapalhada) – Hum… sim, sim, acabou!
Guilherme – OK, OK… posso responder-te a isso mais logo?
Ema – Eles estavam a pedir-me para lhes enviar uma resposta o mais rápido possível.
Guilherme – Ai sim? Bom… podes dizer para encomendarem mais, que depois lá se fazem as contas, está bem?
Ema – Está bem, Pai Natal! Com licença.
Guilherme – Está à vontade!
(O elfo sai da casa-de-banho. O Pai Natal fica uns segundos parado a olhar para o nada.)
Guilherme – Bom, onde é que eu estava, mesmo? Ah, pois! (volta a dançar em frente ao espelho)
-- Pausa para Publicidade –-
Está cansada do seu cabelo de cocó? Já se fartou de gastar o seu dinheiro em produtos capilares que tanto prometem, mas que em nada resultam? Então "Laca Virgin" é para si!
Feita pelos melhores e mais experientes especialistas em cuidado capilar, "Laca Virgin" é o melhor amigo do seu cabelo! Se sempre quis ter o cabelo como a Madonna, esta é a sua oportunidade!
Jingle:
"Laca Virgin, whoo!
Deixa-te o cabelo como o da Madonna nos anos 80
Laca Vi-i-i-ir-gin
Nem sequer é preciso pentear"
Laca Virgin: Caracóis definidos. Cabelo forte. Sífilis... provavelmente...
Laca Virgin não foi submetido a testes laboratoriais. Para mais informações, contacte o seu médico ou farmacêutico. Efeitos secundários podem envolver enfraquecimento do couro cabeludo, queda de cabelo, apodrecimento dos dentes e das gengivas, aparecimento de papos negros nos braços, cancro do cólon, alterações significativas no código genético, multas por excesso de velocidade, a queda do Governo, pragas de gafanhotos, chuvas de rãs, infecções provocadas pela bactéria E. coli e a morte. As farmacêuticas "Santos, Cunha, Ferreira, Mendes, Gomes & Filhos, Lda." não se responsabilizam por absolutamente nada, nos termos do "não nos apetece pagar indemnizações a pessoas que compram este produto na ilusão de ficarem parecidas com uma cantora Pop que até já nem é particularmente relevante". Cumprimentos!
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Com Nenuco és a melhor enfermeira!
Criança 1 - Nenuco Leucemia é tão divertido!
Podes levá-lo a passear... e aos tratamentos!
Criança 2 - Mas cuidado com os sintomas!
E a sorte é que o Nenuco já é careca!
Criança 1 - O Nenuco Leucemia até traz uma máquina de fazer biópsias!
Nenuco Leucemia: para quem sempre quis sofrer por causa de um boneco de plástico!
-- Fim da Pausa --
(Corta para o Guilherme a chegar a pé a um mato, com um machado ao ombro.)
Guilherme - No que tu te metes, rapaz! E tudo para que não te chateiem a cabeça com "o Natal isto" e "o Natal aquilo"... Quero lá eu saber do Natal! Afinal de contas, tudo isto não passa de uma invenção do capitalismo para fazer as pessoas gastarem dinheiro em prendas! "Ai, mas é tão bonita, a ideia do Natal com neve, e a família toda reunida"... Neve? NEM SEQUER NEVA, NESTA PORCARIA DE SÍTIO! Porra para isto tudo! Não há aqui pinheiros! Vou ter que me amanhar de outra forma.
(Corta para o Guilherme na parte de fora de um grande estabelecimento comercial.)
Guilherme - OK, se calhar aqui é mais fácil...
(Volta para o Guilherme no site do WikiHow.)
Guilherme - Bolas, fitas, estrelas... É provável que ainda tenha isso tudo guardado na garagem... Ao que eu me sujeito, francamente!
(Guilherme vai à garagem e pega numa caixa cheia de pó. Sopra, levantando uma nuvem de poeira.)
Guilherme (pelo meio da tosse) - É capaz de ser isto!
(Corta para o Guilherme a olhar para a árvore, já montada e decorada.)
Guilherme - Até nem ficou nada mal!...
(De novo, Guilherme no site da WikiHow.)
Guilherme - Próximo passo: ver um filme de Natal. Não me digam que agora tenho que ir vasculhar nas cassetes do meu pai?!
(Guilherme com um VHS na mão.)
Guilherme - Ah, o bom velho "Pai Natal Conquista Os Marcianos"! Espero que não me desiluda como da última vez...
(Cut-gag do Guilherme sentado a olhar para a televisão.)
Guilherme - Que não seja pornografia! Que não seja pornografia!
(Começa a dar uma música de filme pornográfico)
Guilherme - É pornografia...
(Volta à cena de Guilherme a ver o filme. Vêm-se umas cenas no ecrã da televisão.)
Guilherme (confuso) - Se calhar não era bem a isto que o artigo se referia...
(Corta para o Guilherme no site do WikiHow uma última vez.)
Guilherme - "Planear eventos de Natal"...
(Cena do Guilherme no meio da rua com um microfone.)
Guilherme - Senhoras e senhores, meninos e meninas, tenho o prazer de vos apresentar o mais esperado divertimento deste Natal: o Pai Natal bêbado! Sentem-se e peçam-lhe coisas, e eu prometo que ele vos manda passear de uma maneira diferente de todas as vezes!
Transeunte - GRINCH!
Pai Natal Bêbado - Acho que os teus esforços estão a ser infrutíferos porque tu não estás a fazer as coisas com o espírito necessário! Eu aconselhava-te, se queres saber a minha opinião, a fazer uma reflexão e a tentar perceber o porquê desta tua tão grande repulsa ao Natal. Tentar ir buscar traumas antigos, ou algo assim. Não concordas?
Guilherme - Cala-te!
Alice (a chorar) - O Pai Natal não pode ser mentira! Eu sei que ele existe!
(Alice entra em casa e sobe as escadas a correr.)
Luis - Maria, está tudo bem? (vai até ao fundo das escadas) Maria!
Alice - Não quero falar contigo!
(Luis sobe as escadas e encontra Alice no quarto a chorar.)
Luis - O que é que aconteceu? Está tudo bem?
Alice - O Pai Natal não existe, pois não?
Luis - Quem é que te disse isso?
Alice - O Sr. Mateus, quando eu estava a sair para ir mandar a carta.
Luis - Maria, ia chegar a uma altura em que ias ter que saber... mas é verdade! O Pai Natal não existe. São os pais que compram as prendas às crianças.
(Alice fica em estado de choque.)
Alice - Porque é que vocês haviam de me mentir?
Luis - Para te ver feliz! Acreditar no Pai Natal é um dos últimos pedaços de infância que nós conservamos, e perdê-lo significa perder muita coisa!
Alice - Eu nem sei como reagir! Preciso que me deixes um bocadinho sozinha, por favor!
Luis - É claro! Quando estiveres melhor, anda para baixo, para almoçar.
(Alice põe-se a andar para cá e para lá no quarto dela.)
Alice - Como é que eu pude ser tão burra? Era óbvio que o Pai Natal não ia existir! Não tem lógica, o Sr. Mateus tem razão. Mas eu queria tanto que fosse verdade!
(Entretanto, na Lapónia, um duende entra de rompante no escritório do Pai Natal.)
Carolina - Pai Natal, precisamos de fazer uma saída de emergência! Uma criança acabou de deixar de acreditar em ti e nós não podemos permitir isso!
Guilherme - Todos os anos, milhares de crianças deixam de acreditar em mim e nós nunca nos preocupamos com isso!
Carolina - Mas esta criança é especial, OK?
Guilherme - Porquê? É toda deficientezinha ou assim?
Carolina - TU VAIS TER COM ESTA CRIANÇA E PONTO FINAL!
Guilherme - Mas ainda falta uma semana para a Véspera de Natal. Quem é que vai pagar o gasóleo para esta deslocação extra?
Carolina (irritada) - PAI NATAL!
Guilherme (encolhido) - Não grites comigo.
(Mais tarde, Ema está em casa a ler um livro. Ouve alguém a bater à porta. Vai abrir e é a Carolina.)
Carolina - Olá!...
Ema - Olá!...
Carolina - Olha... desculpa por estar a vir aqui tão tarde, mas... tinha uma prenda para te dar. (dá-lhe um embrulho). Toma!
(Carolina vira costas e começa a descer a rua. Ema fica a olhar para a prenda, com ar meio arrependido.)
Ema - Ei, Bia! (Carolina olha para trás) Obrigado... e feliz Natal!
Carolina (a sorrir) - Feliz Natal!
(Carolina continua a descer a rua, agora com um sorriso na cara. Ema volta a olhar para o presente, também a sorrir. Fecha a porta. Entra e abre-o. É um antigo brinquedo delas.)
Ema - Ela lembrou-se!
(Ema volta a pegar no telemóvel e liga de novo a Carolina.)
Ema - Miúda, faz o favor de voltar aqui neste preciso instante! E eu que não tenha que dizer isto outra vez!
(Carolina está à porta da casa da Ema. Ema está do lado de dentro. Olham-se uma à outra durante uns segundos até que dão um forte abraço.)
Ema - Desculpa por tudo!
Carolina - Eu é que tenho que te pedir desculpa! Nunca devíamos ter deixado que as nossas diferenças nos afastassem!
Ema - Tens razão, Bia! Podemos voltar a ser irmãs, por favor?
Carolina - É claro que sim, parola!
Ema - Parola és tu!
(Entram as duas para casa a rir e a conversar. A porta fecha-se atrás delas.)
-- Pausa para Publicidade –-
É oficial! Acabou de ser lançado o álbum de Natal de Noel Silvestre, "The Best Of Christmas", mesmo a tempo de fazer as suas compras de Natal!
Com clássicos como...
(Noel Silvestre canta músicas de Natal.)
E com magníficos duetos com estrelas como:
- Clara Belém,
- Aurora Boreal,
- e Raquel Luz!
"The Best Of Christmas" de Noel Silvestre… nas lojas agora!
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(Estão duas crianças a brincar num jardim.)
Criança 1 - Pai, Pai! Anda brincar!
(O pai, sentado numa cadeira, tenta-se levantar, mas não consegue, derivado das dores que a sua corcunda lhe provoca.)
Narrador - Sente-se triste por não poder desfrutar de tempo de qualidade com os seus filhos?
(Corcunda acena positivamente com a cabeça.)
Narrador - Tem receio que eles, derivado do seu aparente desapego emocional, o abandonem, quando chegar à 3ª idade?
(Corcunda acena positivamente com a cabeça.)
Narrador - Então nós temos a solução para si! O novo e revolucionário "Quasimodofen" promete diminuir a sua corcunda e aumentar a sua felicidade e qualidade de vida!
Esposa - Estou muito feliz! Desde que o meu marido começou a tomar o "Quasimodofen" que vivemos muito melhor cá em casa! Já consegue brincar com as crianças, fazer as tarefas domésticas, ir à casa de banho sem precisar da minha ajuda... Parece que foi um milagre!
(Surge o corcunda parado na rua)
Corcunda - Eu antes era coxo e marreco, mas graças ao "Quasimodofen", agora só sou coxo! Obrigado, "Quasimodofen"!
(Corcunda vira-se de costas e começa a andar, coxeando)
Narrador - Quasimodofen: o segredo da sua felicidade está aqui!
Quasimodofen é um produto "Santos, Cunha, Ferreira, Mendes, Gomes & Filhos, Lda."!
-- Fim da Pausa --
(Cena do Guilherme a falar ao telemóvel com a Marisa na sala.)
Guilherme - Já decorei uma árvore, já vi filmes de Natal horríveis, já ouvi o "All I Want For Christmas Is You" umas boas dezenas de vezes... porra, até comprei uma rena!
(Guilherme olha pela janela. Cena de uma rena a comer erva no jardim.)
Guilherme - Estás satisfeita, agora?
Marisa - Satisfeita, eu? Se estás a fazer isto para me agradar, podes estar quietinho! Sinceramente, eu não te consigo perceber! Já pensaste que, se calhar, os teus esforços estão a ser infrutíferos porque tu não estás a fazer as coisas com o espírito necessário? Eu aconselhava-te, se queres saber a minha opinião, a fazer uma reflexão e a tentar perceber o porquê desta tua tão grande repulsa ao Natal. Tentar ir buscar traumas antigos, ou algo assim...
Guilherme - Isso foi exactamente o que me disse o Pai Natal Bêbado...
Marisa - Mas entendes onde é que eu quero chegar com isto? Talvez tu sejas mesmo igual ao Grinch e, quem sabe, exista uma razão para não gostares do Natal!
Guilherme - Agora que falas, talvez haja mesmo. É que sabes? Eu nunca soube o que era o Natal... Os meus pais nunca ligaram a isso. Não me lembro de ter recebido uma única prenda; não me lembro de ter decorações em casa; não me lembro de ouvir uma música que fosse... E eu via os meus amigos todos ansiosos pelo dia 24 e, para mim, isso sempre foi sinónimo de tristeza e melancolia, nada mais! A única pessoa que me lembro de me desejar um feliz Natal e de me dar sempre uma fritinha era o meu bisavô...
Marisa - Está na altura de mudares isso! Tu és capaz, eu sei que sim! Bom Natal, miúdo!
Guilherme - Bom Natal...
(Desliga o telemóvel. Olha pela janela.)
Guilherme - Estás satisfeito, Universo? Eu estou a festejar o Natal! Quem é que eu quero enganar? Só um milagre é que podia fazer com que isto tivesse algum sentido na minha cabeça!...
(No céu, vê-se uma estrela brilhante a pulsar e ouvem-se sinos e um "Ho-Ho-Ho".)
Guilherme (a olhar para a câmara) - Não era tão bom se a vida fosse mesmo assim?
(Alice está a olhar pela janela do quarto e vê a mesma estrela a pulsar no céu.)
Alice – Será possível?
(Pega no casaco, sai do quarto a correr e dirige-se para a porta.)
Luis – Onde vais com essa pressa toda, Maria?
Alice – Vou provar que o Pai Natal existe. Se quiseres, podes vir ver!
(Da janela de casa, o Rui também vê o clarão no céu.)
Rui (encolhendo os ombros) – Sempre soube! (fecha a janela)
(Cena na casa da Ema, com as duas à conversa sentadas no sofá.)
Carolina - Já reparaste que só para nós é que o facto de Pai Natal estar a aparecer ou não foi indiferente?
Ema - Por acaso... Mas, se calhar, é melhor irmos lá ter na mesma!
Carolina - Sim, vamos!
(Reúnem-se todos num largo à frente do sítio onde a luz que se via no céu aterra. O Pai Natal.)
Pai Natal – Olá, pessoas!
Todos (em uníssono) – PAI NATAL!
Pai Natal – É, sou eu mesmo!
Ema – Onde é que está o teu trenó?
Pai Natal – Está ali para trás, estacionado na mata.
Guilherme – Não estás a dizer isso só porque não há orçamento para ter aqui um trenó a sério, pois não?
Pai Natal (atrapalhado) – Nada disso! É mesmo porque o estacionei ali atrás…
Carolina – O que é que estás aqui a fazer? Ainda não é Natal!
Pai Natal – Vim aqui de propósito por uma razão muito especial: para restaurar a crença de uma menina em mim!
Alice – Eu, Pai Natal?
Pai Natal – Sim, tu mesmo! Maria, eu sou real!
Alice – Eu sabia, Pai Natal, eu sabia! (abraça o Pai Natal)
Luis – Espera aí! Se tu existes mesmo, então por que raio é que sou eu que compro as prendas de Natal?
Pai Natal (atrapalhado) – É que sabe, houve alguns cortes no orçamento, tivemos de nos ajustar à inflação, e… Ui, que horas já são! A Mãe Natal dá cabo de mim se chego atrasado para jantar! Adeus, pessoal! Adeus, Maria!
Alice – Tchau, Pai Natal!
(O Pai Natal desaparece por entre a vegetação.)
Ema – Então e agora?
Carolina – Eu sou capaz de ter uma ideia…
(Cena com todos sentados em cadeiras a assistir a um concerto de Natal do Noel Silvestre.)
Guilherme (num aparte, olhando para a câmara) – Faz algum sentido esta história estar a acabar assim? Não, não faz! Mas quer dizer: tendo um palco disponível, tinha de o utilizar, e também não podia desperdiçar um personagem como o Noel Silvestre, não é? Vá, pessoal, aproveitem a viagem! Feliz Natal!
FIM
